Qui, 12 Dezembro 2024

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Silêncio ou confissão?

VÍTOR CATULO, Cidadão Eleitor nº B-932

A angústia é definida como sendo uma sensação psicológica dolorosa que se caracteriza por um estado de ansiedade e insegurança com quebras de humor podendo levar à depressão. Neste quadro – mais grave – quase sempre associado a um trauma ou a uma lembrança dolorosa, a vítima perde vitalidade, desenvolve um sentimento de  baixa autoestima, isola-se do mundo exterior, teme o futuro e, em última análise, põe termo à vida.

Todos nós passamos por momentos de angústia e ansiedade ao longo da vida: começando, ainda com tenra idade, desde que passamos a dormir sozinhos ou nos lapsos de tempo em que os progenitores vão trabalhar ou se ausentam no exercício de outras atividades, passando pelas tradicionais cólicas com a aproximação dos exames escolares, pelo resultado do concurso daquele emprego a que nos candidatamos ou pelo ordenado que nunca mais chega com com as contas por pagar, todos experimentamos já essa sensação desagradável e inquietante de termos um aperto no peito e borboletas no estômago.  Situações normais que o tempo se encarrega de fazer passar e nos fortalecem a cada experiência. 

Quem tem ou teve filhos naquela idade em que os miúdos pensam saber já tudo, certamente já se inquietou por não estarem em casa à hora marcada no regresso da escola ou de uma saída com os amigos. Faltas menores que na maior parte das vezes se resolvem com um ralhete. Imaginarmo-nos, porém, numa situação de não sabermos onde eles param durante largos períodos de tempo é um exercício impossível de fazer quem nunca a viveu. Não saber o que aconteceu a um filho durante anos a fio, vivendo dia após dia, é seguramente a maior da provações a que um pai e uma mãe podem ser submetidos. É de proporções bíblicas o sofrimento que o casal Teixeira tem vivido. A dor profunda daquela pobre mãe e a dor herculeamente digerida, alicerçada numa fortíssima personalidade, do marido, não deixa de nos tocar e merecem-nos solidariedade. Aqui lhes faço vénia.

E aplaudo o acórdão do Tribunal da Relação do Porto, conhecido quinze anos depois sobre a data dos factos (tardou, mas fez-se justiça) que revoga a decisão absolutória do Tribunal de Lousada e condena o arguido Afonso Dias na pena de prisão efetiva de três anos e meio pelo crime de rapto de Rui Pedro. Não compreendendo como foi possível os magistrados terem alterado toda a ordem dos factos e colocado Filomena como a última pessoa a ver o filho e não Afonso, como diz a acusação e afirmando que "os raciocínios vêm dar razão às críticas que se tecem a respeito da excessiva dimensão e verbosidade das nossas decisões judiciais em prejuízo da sua clareza e ajustamento à verdade material" os juízes desembargadores não dão razão e admoestam desta forma os seus colegas da 1ª instância, numa clara demonstração de justiça pragmática e adequada resposta a quem detrata na praça pública a nossa magistratura judicial acusando-a de ser laxista e corporativa.  

O desaparecimento do Rui em 4 de Março de 1998, que abalou o país e consterna todos nós, é um caso paradigmático de sofrimento na sua mais elevada expressão de horror. De horror para o jovem, de quem não há notícias, e para os seus pais. E um paradigma da mais ignóbil e aberrante miséria moral a que alguém pode chegar quando oculta a verdade dos factos protegido pelo direito ao silêncio que a lei consagra. Não me repugnaria que tal direito que se reconhece – e bem – ao arguido, fosse levantado em casos pontuais desta natureza quando se constatasse que o bem jurídico a proteger – a vida – fosse superior aos direitos processuais de quem é fortemente suspeito de esconder os contornos dos factos que praticou ou nos quais participou. Nem que para tal, in extremis, se tivesse que recorrer a drogas químicas clinicamente administradas sob a égide, sábia e prudente, de um juiz. 

A ciência forense está avançada e todos os dias descobrem-se novas metodologias de investigação. Tempos houve, de má memória, em que a confissão era a rainha das provas. Hoje é rainha a prova testemunhal suportada por perícias e vestígios materiais. Mas por outro lado, e na mesma proporção, a criminalidade aumenta e sofistica-se. Raptos e sequestros sucedem-se a um ritmo alucinante com contornos de grande violência e finais dramáticos. Já vai sendo tempo de se repensar o quadro jurídico-penal português e adequá-lo à nova realidade.

Não podemos nem devemos continuar ancorados a conceitos filosóficos e fastidiosa retórica a pugnar pela defesa intransigente dos direitos de arguidos que não colaboram e não nos merecem consideração, em detrimento dos direitos das vítimas. Tais conceitos, pesados, cinzentos e sujeitos a dúbias interpretações, emperram a máquina judiciária e revelam-se ultrapassados, obsoletos e inadequados no Portugal do século XXI.

A vida humana e a integridade física das pessoas são bens preciosos demais para serem tratados com ligeireza ou leviandade

Vítor Catulo

Cidadão eleitor nº B-932

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