Não sou do tipo daqueles tipos que, chegados ao fim de semana, compram tudo o que é semanário e revista. Não por falta de vontade ou porque não queira, simplesmente é por falta de dinheiro que é o que não falta a muitos a quem a crise não afetou por aí além.
Mas o gosto pela leitura de semanários está-me na massa do sangue e, volta e meia, não resisto e lá vou ao quiosque mais próximo a comprar uma revista ou um jornal massudo que me garante leitura pelo menos para as setenta e duas horas seguintes.
A publicidade cumpre o seu papel e o anúncio, a meio da semana, dos temas de fundo das publicações que vêm a lume, costumam orientar a minha escolha. Foi o que aconteceu com a última edição da revista Visão: ouvi na rádio “missão de alto risco ainda podemos confiar nas nossas polícias?”.
O triplo homicídio na Quinta do Conde perpetrado pelo idoso insano, que mascava ódio e rancor, foi o mote para uma reportagem a oito páginas sobre a GNR e a PSP onde são elencados “os problemas de uma carreira mal paga, com falta de meios, riscos e polémicas associadas”.
É recorrente este género de reportagens por parte dos mídia após incidentes em que são vitimas agentes das forças policiais: só na PSP tombaram em serviço 30 agentes nos últimos vinte anos. E o diagnóstico que se faz, porque é de facto o verdadeiro, é quase sempre o mesmo: falta de efetivos, cargas horárias pesadas, remunerações muito aquém das desejadas, desmotivação no cumprimento do dever, falta de equipamentos de proteção adequados, parque automóvel envelhecido, etc. etc.
Mas não é por via das deficiências referidas, reclamadas periodicamente pelos dirigentes e porta vozes das associações profissionais e sindicatos, que se matam polícias ou se desrespeita quem exerce funções de autoridade em Portugal.
Paira na sociedade portuguesa uma certa sensação de impunidade que penso ser resultado de uma cultura de condescendência e excessiva tolerância por parte das nossas autoridades judiciárias na avaliação do grau de censurabilidade de crimes contra a autoridade pública.
Todos os dias os tribunais absolvem arguidos que ofenderam, de qualquer forma, agentes policiais no exercício das suas funções ou em consequência destas.
Com base em processos muitas vezes mal instruídos ou dirigidos com ligeireza, como se estivesse em julgamento uma qualquer peixeirada entre vizinhas, a análise crítica de quem decide condutas que poem em causa a ordem e a tranquilidade públicas e a autoridade do Estado, é enviesada.
E havendo condenação, invariavelmente decreta-se a suspensão da pena, o que na prática é uma quase não condenação.
As hierarquias policiais reservam-se não se pronunciado ou esquivam-se a entrevistas quando se conhecem decisões judicias que beliscam o respeito que se deve a quem exerce funções de agente de autoridade. Compreende-se, pois arriscam-se a perder a “confiança política” de quem governa, tal como aconteceu em 1997 quando o então Comandante Geral da PSP, General Gabriel Teixeira, foi exonerado do cargo por se juntar ao coro de protestos de milhares de polícias por todo o país em consequência da medida de coação de prisão preventiva aplicada a um agente da PSP de Évora que matou acidentalmente um assaltante.
A repressão oportuna de um delito menor pode determinar a não prática de um crime maior.
O diferendo que opunha Rogério Coelho ao seu vizinho polícia, o malogrado agente António Pereira, durava há muito, pelo menos há uma década, e aquele já havia sido condenado outrora por agressão a este último. Mas tão leve foi a pena que se esqueceu. Não terá feito grande mossa a obrigação do pagamento de uma indemnização de algumas centenas de euros ao então queixoso a quem acumulou fortuna na construção civil. Se tivesse sido, em tempo devido, condenado a uma pena efetiva de prisão, nem que fosse por uns dias, refreava-se-lhe o ímpeto assassino e poupar-se-iam três vidas.
Justiça branda. Até quando?