“Ou você tem uma estratégia própria, ou então é parte da estratégia de alguém”, é assim que Alvin Toffler definiu a necessidade de pensarmos pelas nossas próprias cabeças e a importância de tomarmos as nossas próprias decisões.
Toffler, que faleceu em Junho de 2016 com 88 anos, nasceu norte-americano e era descendente de emigrantes polacos. Cresceu num bairro noviorquino onde a sobrevivência se media pela quantidade de murros e pontapés que se davam e se levavam. Doutorou-se em Letras e, nos anos 50, numa América segregacionista e por isso em convulsão, atreveu-se em perfilar com o ideário de quem defendia o alargamento dos direitos civis, constitucionalmente consagrados mas sistemicamente violados, à população negra. O atrevimento causou-lhe dissabores com as autoridades com algumas passagens desagradáveis pela esquadra. Não foi um ativista, na verdadeira aceção do termo, outrossim foi simpatizante de uma causa que hoje, muitos de nós felizmente, sabemos ter sido justa.
Não foi ativista de direitos humanos, mas foi um visionário e um futurista, quase um profeta social. No seu primeiro livro, O Choque do Futuro, que publicou em 1970, um ano após o Homem ter chegado à Lua e de se darem os primeiros passos para a invenção da Internet, Toffler já delineava três previsões que são hoje realidades e fazem parte do nosso quotidiano: o enfraquecimento da família tradicional, o impacto da biotecnologia e a possibilidade de se trabalhar em casa a quilómetros do escritório.
Na verdade, a figura do pai austero que trabalhava para sustentar a família enquanto a mãe cuidava das lides domésticas e da educação dos filhos, são hoje uma ficção e as imagens do avô, patriarcal e omnipresente, a contar histórias aos netos atentos reunidos à sua volta a chupar rebuçados de alcaçuz para a tosse, enquanto a avozinha cozia meias ou fazia uma tarte de maçã para o lanche, são miragens que passam no canal História ou na RTP Memória. Os machos alpha de outrora que ainda resistem têm os dias contados e ficarão um dia a falar sozinhos e hão-de recolher-se às “grutas tecnológicas” que lhes criaram. Os miúdos já não os vão ouvindo e as mulheres que, com tanto esforço e sedução conquistaram, vão estando fartas deles.
Na biotecnologia, os avanços foram tão galopantes que descobertas e invenções como a reprodução in vitro, a clonagem, a pílula do dia seguinte ou a manipulação transgénica são hoje banais. Avança-se agora, por esconsos e perigosos caminhos, para uma área da ciência que é a nanotecnologia: manipulação da matéria numa escala atómica e molecular. Um ramo da Ciência de consequências imprevisíveis para a Humanidade que ainda se debate com gravíssimos problemas de fome e com a mais infame miséria em várias partes do globo que afeta centenas de milhões de seres humanos. Muitas vezes não nos lembramos disso.
Mas o mais preocupante, a terceira vaga, prevista no livro homónimo que Toffler editou em 1980, é a massificação do pensamento e a uniformização dos nossos atos através dos meios multimédia. Estamos quase a cair no abismo se não criarmos a nossa própria estratégia, ou seja: parar para pensar.
É dado adquirido que os gigantes das tecnologias de comunicação tomaram de assalto os governos e as empresas globais que os controlam. Estão a capturar as nossas mentes e condicionam-nos comportamentos e atitudes. As operadoras não nos largam e o alinhamento das notícias na cabo e nos jornais é uniforme. A estratégia desses colossos fascinantes, que ajudamos a criar, é não deixar haver massa crítica – a contracorrente – enquanto nos entretêm.
Anestesiam-nos com a sua saliva as sanguessugas antes de nos chupar o sangue. Põem-nos dormentes e incentivam-nos ao consumo desnecessário e descomedido os massmidia. Criam frases e tendências que reproduzimos inconscientemente e que nos preparam para aceitar verdades, dadas por inquestionáveis, como a de haver diferenças entre raças e credos ou que as guerras entre povos fossem a coisa mais natural da natureza humana!
Um cenário negro, de ovelhas em fila a olhar para o rabo da que vai à frente, que diviso no horizonte se não nos impusermos em criar a nossa própria estratégia: a de pensarmos com as nossas cabeças. Apenas isso!
Que tenhamos coragem para fazer pausas encerrando telemóveis, televisões e computadores a determinadas horas do dia (às refeições, por exemplo) e que nos obriguemos a conversar uns com os outros. Uma obrigação hercúlea para alguns, muitos talvez, mas humanamente necessária.
Por mim começo já agora e vou ler um livro, em papel, em bom e cheiroso papel timbrado, sublinho.