Schhh!
Hoje, quero contar-vos um segredo.
Schhh! Não façam barulho. Fica só entre nós. Quero fazer-vos uma confissão, falar-vos de uma pessoa muito especial. Aproximem-se, conto-vos ao ouvido. Só podemos falar das pessoas especiais ao ouvido, para não fugirem. Escutem, não façam barulho. Schhh!
É segredo.
Todos temos amigos que nos proporcionam momentos de aprendizagem raros. Ou seria expectável que assim fosse. Aquelas pessoas extraordinárias que nos fazem olhar o milagre da vida com olhos de quem se encanta a cada forma alcançada. Todos conhecemos seres que reverenciamos por nos trazerem golfadas de inspiração e conforto, da força motriz necessária ao milagre da vida. O milagre da vida… esse acaso, esse movimento ininterrupto com uma ordem que ainda não sabemos explicar. Fecha os olhos. Sim, fecha os olhos. Nem tudo o que não sabemos explicar carece de explicação. Sentir, é esse o rumo dos nossos passos. Sente. Sente agora. Fecha os olhos. Sente o milagre da vida em ti.
Todos temos amigos que nos proporcionam momentos de aprendizagem raros e que dão sentido ao milagre da vida em nós. Um dos meus chama-se Paulinho. Paulinho da Viola. É ele que canta amar é simplesmente dar sem condição alguma é dar é dar é dar. Cabelo grisalho, sorriso sereno e gentil, homem dos seus cinquenta anos. Corrijo. Tem somente cinquenta anos em corpo físico, humano. O Paulinho é muito mais do que os cinquenta anos que já viveu na Terra. É um ser milenar. Cósmico. E sabe que o é, o que o torna ainda mais… ele mesmo. Deveríamos ser todos assim, mais nós mesmos, em vez de mais do que os outros querem que sejamos. O mundo está lotado de pessoas que são tanto dos outros… É por isso que as pessoas especiais são cheias delas mesmas, de tão grandes que são. Por isso são especiais.
Não sei porque chamamos Paulinho ao homem que nasceu Paulo. Talvez por ser um nome que traduz todo o amor que o Paulo contém. Essa malta da meditação e a mania do amor, escarnecem. Nós sorrimos. Sabemos que é o amor que nos salva. Nada mais. Nem sabedoria, nem riqueza, nem estatuto. Somente o mais puro e livre amor por tudo e todos. O Paulinho ensinou-me isso também. É um ser milenar, como vos disse. Cósmico.
Como é professor de yoga, as parábolas brotam-lhe do peito e transfiguram-se em palavras que nos prendem os olhos e os ouvidos. Fala com a doçura de quem nada sabe, sabendo tanto. Um dia, falou-me da diferença entre uma mosca e uma abelha. Enquanto as moscas se alimentam da podridão, do sujo, do esterco, as abelhas bebem do mais puro néctar das flores. E surge o mel. As abelhas têm foco, método. Assim é nas nossas vidas. Ou deveria ser. Quantos de nós são como as moscas em desnorte? E quantos de nós têm a disciplina de quem fabrica o mel?
O Paulinho é esse ser terno que nos mima com canções e histórias. É um observador atento, escuta escuta escuta. Depois fala. E sempre fala assertivamente. Fica o desejo de o ouvir mais, como se fosse insuficiente o que diz, face à sabedoria que carrega. Sorri com o sorriso de quem aprecia viver na Terra, de quem aprecia a vida. O milagre da vida materializado num sorriso. Há pessoas que confirmam a bondade e o pacifismo no mundo.
Escolho cercar-me de pessoas como o Paulinho. Pessoas que me inspiram, que me mostram mais do milagre e da beleza mais pura e elevada. Sou ávido de saber, um insatisfeito. E estar rodeado de pessoas que o são em todas as dimensões que a palavra pessoa comporta dá-me a oportunidade de escutar, de aprender. Evoluir enquanto ser. É esse o meu propósito. Evoluir, tornar-me no melhor de mim. E se podemos estar rodeados de pessoas que potenciam o melhor de nós, para quê insistir em cruzar o horizonte solitariamente?
O Paulinho faz parte deste segredo. Podemos escolher caminhar na solidão dos nossos passos, mas cresceremos mais se a nossa solidão puder segurar a mão de um amigo. Vivemos em sociedade para que possamos dar as mãos, não para cruzarmos os braços. Por alguma razão somos tantos a pisar a mesma terra.
A ti, Paulinho, grato por me dares a mão.
Schhh! Fica só entre nós.
É segredo.
Samuel Pimenta
Escritor