Tenta estancar a vida e verás que jorrará de todos os diques que sobre ela ergueres. Tenta impedir que a perfeição da roda gire e verás que jamais a roda pára de girar. Tenta abafar o sopro da vida, impedir que o ar a encha por dentro e a anime, e verás que se eleva o grito, a fúria e a ânsia de viver.
A vida é uma esfera lisa que rola sem fim. Levamos grande parte das horas que vivemos a mirar-lhe uma ou outra superfície. Raramente a olhamos na amplitude que a define. Uma esfera, não uma mera aresta. A unidade que reúne em harmonia todos os traços que lhe dão forma, pura simetria manifestada num movimento contínuo que não cessa. Para a veres, precisas de caminhar, caminhar sempre. Que ao parares na estrada, possam teus pés manter-se em movimento, caminhando em frente. A vida só se entende, só se enxerga, quando caminhamos rumo a nós determinadamente, sem medo. E mesmo quando temeres manter o movimento circular da roda que és, não cesses o curso do rio que rompe de ti. É vencendo o medo que te aproximas mais um pouco da real forma que te delimita o ser.
Pois que te acontece se garroteares o sangue que te habita? Que será de ti se te privares do gesto que te salva da solidez? Diz-me, que serás tu se viveres como as estátuas? Olhar vítreo, palavra cativa da pedra que te detém? Que nenhum homem ou mulher viva querendo tornar-se rocha viva! As rochas são formas que só o tempo pode talhar. Mas os homens são formas com a mestria do escultor. És tudo o que quiseres ser. Para isso, rola, não pares de rolar. Não queiras deter a vida em ti, privar-te do êxtase de sentir o ritmo na pele. Cada passo teu é parte da vida a pulsar. Vive, somente. Sem diques ou forças que te detenham. Vive a liberdade que te permite o ser. E sê isso, sê tudo isso que és. Perfeito e irrepetível. Unicamente tu.
Samuel Pimenta
Escritor