Construir uma plataforma para a acção do Estado
Gostava que consenso e concertação fossem claramente distinguidos.
Ouço frequentemente dizer que precisamos de consensos. Errado. Estar de acordo sobre as coisas não é natural. Onde há duas pessoas há diferendos.
E como podemos ver no espectro político que temos não há vestígios de qualquer consenso. Sobre quase nada.
A questão é a de saber como gerimos os nossos diferendos.
A política deve ser a afirmação da diferença, do pluralismo e do contraditório? Sim.
Após o 25 de Abril, naturalmente, reagimos ao sufoco da ditadura com um poderoso movimento de construção de movimentos de opinião, de correntes de pensamento, de projectos políticos, diferentes, diversos, plurais.Foi a proliferação da diferença.
Podemos esgotar-nos na afirmação da diferença? Pode a democracia alimentar-se apenas do diferendo?
O movimento puro do exercício de afirmação de diferença e do contraditório fecha-nos no sectarismo, no dogmatismo e na rejeição do “diferente”, na afirmação repetida e repetitiva da “mesma” verdade: a nossa.
A política deve ser também aprender a habitar outro território: o território da negociação e da concertação.
Do que precisamos é de fazer a aprendizagem de uma outra cultura: da negociação e da concertação. Porque concertar posições não é fazer consensos. É construir plataformas de acção apesar das nossas diferenças e diferendos. É para isso que serve a negociação. Como diria Descartes em teoria podemos duvidar de tudo, mas na acção, no dia a dia, a vida exige-nos decisões.
Na circunstância actual precisamos de uma plataforma para a acção do Estado. Que define invariáveis da acção do Estado a, pelo menos, médio prazo. Que o subtraia aos voluntarismos conjunturais e momentâneos. Que lhe dê consistência e eficácia. E credibilidade. E uma base social e política de apoio mais alargada.
Com Passos e Gaspar nunca houve vontade e capacidade de negociar nada: Apenas o voluntarismo radical de “ir além da Troika, custe o que custar”.
Portas quer passar entre os pingos de chuva sem se molhar e vai abrindo portas ao PS de Seguro.
O PCC e o BE professam outro radicalismo voluntarista anti Troika e em nome dos princípios não negoceiam nada … mantêm portas fechadas.
Seguro e o PS, em véspera de Congresso, espero que mantenham viva a vontade de que o país precisa: abertura para construír com outros a plataforma para saír da crise e os caminhos de um desenvolvimento sustentável. Que defina opções de política orçamental claras, que construa uma visão do Estado de que precisamos, que proponha um caminho para o crescimento da economia e do emprego, que reforme o sistema político e prestigie a representação democrática, que contribua para uma política europeia, retome o primado da política sobre as tentações tecnocráticas que nos afogam .
Sócrates fez, há doís anos, um ensaio e um desafio e ouviu um não de todos os outros.
Seguro tem pela frente uma tarefa e um desafio: mas tem que fazer-se ouvir, abrir portas, pontes e passagens, obter sins, abrir uma nova etapa na cultura política portuguesa.
Desejo-lhe sorte.
Nélson Carvalho
Consultor