Como todos nós, vi na comunicação social a notícia de iniciativas legislativas do PCP e do BE no sentido de introduzir a obrigatoriedade da exclusividade no exercício da função de deputado da Nação, na Assembleia da República.
Não li os textos das propostas, que desconheço.
As notícias destacavam também o facto de tais iniciativas terem sido chumbadas pelos deputados do PSD, CDS e PS. (Confesso: eu esperava que uma iniciativa contendo esta proposta pudesse ser feita pelo PS, o meu partido)
Podemos também ler que diversos deputados do PSD e do PS teriam entregue declarações de voto.
Se não erro, tais declarações diriam basicamente o seguinte:
– Votamos contra, embora concordemos com a exclusividade, porque se trata de uma iniciativa desgarrada e avulsa. Deveria ter outro enquadramento e outra profundidade, incluindo outras propostas para reformar o sistema eleitoral … etc …
– Votamos contra, embora concordemos com a exclusividade, porque esta proposta não é oportuna, porque é demasiado próxima de eleições, porque se pode confundir com populismos anti-parlamento, porque deveria ter outro enquadramento …
Acontece que eu defendo que o exercício da função de deputado à Assembleia da República deve ser realizado em regime de exclusividade e tenho-o defendido publicamente.
Acontece que eu entendo que o exercício destas funções nobres na Representação Democrática não se deve confundir com o exercício de outras funções, publicas ou privadas.
Acontece que eu entendo que a falta de clareza e de transparência no exercício das funções de deputado da nação abre caminho ao princípio da suspeita generalizada sobre quem representa o quê e aonde e para quê.
Acontece mesmo que eu entendo que a acumulação de funções de deputado com o exercício de funções ligadas a universidades, escritórios de advocacia, empresas de consultoria, bancos, empresas de construção … etc. permite o efectivo tráfico de influências e corrupção, que a democracia e o Estado de Direito devem combater.
Acontece, em suma, que eu entendo que há um efectivo conflito de interesses na acumulação desta função com outras, públicas ou privadas.
Há os deputados que assumidamente são a favor da acumulação e legislam em causa e em benefício próprio ao permitirem a acumulação.
Os deputados que subscrevem aquelas declarações de voto querem dizer-nos que são contra, mas achando todavia que tudo deve ficar na mesma.
O PSD, o CDS e o PS, enquanto partidos, assumem a bondade da acumulação. Ainda não entenderam porque motivos 83% dos portugueses estão descontentes com a democracia que têm. Ou, entendendo, preferem fazer como o escaravelho: fingir de mortos e esperar que passe.
Nélson Carvalho.