Paulo Fonseca, o ex-presidente da Câmara Municipal de Ourém, jurou estar “totalmente inocente” da acusação de um crime de peculato, pela qual começou a ser julgado no Tribunal de Santarém, esta quarta-feira, 31 de maio.
Recorde-se que o caso envolve a alegada contração fictícia de um treinador de futsal, Pedro Henriques, para uma equipa do concelho de Ourém, o GD Freixianda, em 2011, e que foi remunerado através de uma empresa municipal, a OurémViva, como vigilante numa escola básica onde nunca terá sequer entrado.
Dos cinco arguidos do processo, apenas Paulo Fonseca e José Alho, na altura vice-presidente da autarquia e presidente do Conselho de Administração da OurémViva, prestarem declarações ao coletivo de juízes, nesta primeira sessão de julgamento.
Os dois responsáveis políticos contrapuseram a acusação do Ministério Público (MP), que os acusa de ter tido conhecimento e intervenção direta no esquema fraudulento para contratar o treinador, pagando-lhe 1.200 euros mensais de salário, que o clube não podia suportar.
“Só tive conhecimento dos factos de que sou acusado quando tive conhecimento do processo”, começou por afirmar Paulo Fonseca, acrescentando que nunca pediu a José Alho para contratar nenhum treinador como funcionário de uma escola através da OurémViva, que era responsável pela afetação de recursos humanos nos estabelecimentos de ensino.
O ex-presidente de Câmara e ex-Governador Civil de Santarém explicou ainda que não se recorda de ter participado num almoço com Pedro Henriques e Rui Vital, ex-presidente da Junta de Freixianda pelo PS e atual vereador na Câmara de Ourém pelo PSD, que surge como arguido por ter sido ele a iniciar os contatos para elaborar a contratação fictícia do treinador de futsal.
Mesmo a ter ocorrido esse almoço, que consta do processo, “nunca esse assunto foi falado”, garantiu o autarca, que, em relação à contratação de Pedro Henriques como vigilante da EB da Freixianda, disse ter apenas assinado documentos que foram preparados pelos serviços da autarquia e da OurémViva, desconhecendo quem era o funcionário que estava a ser contratado ou para que funções.
José Alho também descarta responsabilidades
“Estou de consciência tranquila”, começou por dizer ao coletivo de juízes o ex-responsável da OurémViva, explicando que na altura em que Pedro Henriques foi efetivamente contratado como vigilante – em agosto de 2011 – tinha pedido suspensão das suas funções como administrador da empresa, por incompatibilidades com o então vice-presidente da empresa municipal, João Sousa.
O advogado de José Alho e Paulo Fonseca, João Nabais, chamou a atenção do tribunal para a existência de uma ata da OurémViva que prova que o ex-vereador não estava presente na reunião do Conselho de Administração que aprovou a contratação, reunião essa presidida por João Sousa.
José Alho disse que só teve conhecimento do assunto meses mais tarde, quando o assunto ganhou dimensão após denuncias em blogs anónimos e foi questionado numa Assembleia Municipal de Ourém.
Só então, e já depois de regressar novamente à OurémViva, é que averiguou realmente as funções desempenhadas por Pedro Henriques escola da Freixianda, e disse ter “ficado tranquilizado” porque, após uma reunião com os serviços da empresa municipal, o treinador aceitou de livre vontade rescindir o contrato e devolver parte do dinheiro que tinha recebido, referente a faltas não justificadas.
Recorde-se que Pedro Henriques devolveu 343 euros dos 4.483 euros que recebeu, durante cerca de oito meses.
“Ora, se me transmitiram que o trabalhador devolveu verbas de dias em que não trabalhou, pressupus que tivesse trabalhado os restantes, a cumprir as suas funções”, explicou José Alho, remetendo para os serviços de educação da Câmara a responsabilidade de toda a tramitação burocrática do processo.
Duas testemunhas vão regressar ao tribunal
Após as declarações dos dois arguidos que não se remeteram ao silêncio, foram ouvidos o ex-presidente do GD Freixianda na altura dos factos (que admitiu que o clube tentou arranjar emprego a Pedro Henriques), a chefe dos serviços administrativos da Escola Básica da Freixianda, Lúcia Gonçalves, e o assistente operacional da mesma escola que era responsável pela elaboração do livro de ponto que controlava a assiduidade dos funcionários, José Marques.
Ouvidos por videoconferência, os dois, que são marido e mulher, relataram ao coletivo de juízes que nunca tinham visto Pedro Henriques a trabalhar como vigilante na escola da Freixianda, mas a defesa, através de João Nabais, solicitou a sua presença novamente no Tribunal de Santarém, no próximo dia 20 de junho, para serem confrontados com outros documentos.
Assessor parlamentar repreendido por falta de respeito ao Tribunal
A inquirição da terceira testemunha foi interrompida pela juiz presidente do coletivo, Ana Paula Rosa, para repreender verbalmente o arguido João Heitor, que, na altura dos factos, era chefe de gabinete de Paulo Fonseca e é atualmente assessor do grupo parlamentar do PS na Assembleia da República e professor no ensino superior.
A juiz considerou que João Heitor exibiu, durante parte da sessão, um comportamento desrespeitoso para com o Tribunal, ao esboçar sorrisos jocosos quando ouvia as declarações prestadas pelas testemunhas.
Um “comportamento inadmissível para quem está sentado onde o senhor está”, considerou a magistrada, que aconselhou João Heitor, que optou por não prestar declarações sobre os factos, a ter outra postura perante o tribunal.