Foi a família da mulher quem denunciou o caso ao Ministério Público (MP), à Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) e à Segurança Social, depois de ter sido surpreendida com o facto do LENE nunca ter formalizado a queixa junto das autoridades com competências de investigação deste tipo de crimes públicos, tendo optado por resolver o caso “internamente”.
De acordo com os vários familiares que contaram o caso à Rede Regional, foi a própria idosa, que apesar da idade avançada “está completamente lúcida”, quem denunciou o excesso de intimidade a que o funcionário a sujeitava, e a forma como lhe tocava quando lhe dava banho, fazia a higiene ou vestia.
“Ela contou, preto no branco, que o homem a apalpava, mexia onde não devia e queria abusar dela, e não queria de forma nenhuma estar ao pé dele. Nessa altura, estava completamente alterada e transtornada”, conta uma familiar, que pede reserva de identidade tendo em conta a natureza do caso.
A 19 de fevereiro, segundo os queixosos, a situação foi exposta à direção do LENE, que prometeu abrir um processo disciplinar para afastar de imediato o funcionário, realizar exames ginecológicos à idosa e reportar a denuncia à GNR.
“Percebemos depois que não fizeram nada disso”, explica a mesma familiar, que, em meados de março e já com as visitas presenciais proibidas devido às regras impostas pelo combate à pandemia da COVID-19, ligou para o lar após uma ida da idosa ao hospital e descobriu que o alvo das suspeitas já estava novamente em funções, pois foi este funcionário, de 53 anos, quem atendeu o telefone.
Incrédulos, os familiares tentaram então perceber em que pé estava o processo, tendo vindo a descobrir que o mesmo já tinha sido conduzido e concluído apenas pelo LENE, ilibando o funcionário sem ter promovido exames médicos especializados à idosa (foi apenas observada pelo médico que presta serviço no lar) e sem reportar a queixa às autoridades.
Lar rescindiu contrato com idosa ao saber da queixa-crime
Perante a decisão da direção do lar, a família, a 28 de março, denunciou o caso a várias entidades, entre as quais a PJ, que, via telefone devido à pandemia, já começou a recolher informações junto das várias partes envolvidas, estando o caso sob segredo de justiça.
Ao ter conhecimento da investigação policial em curso, o LENE, a 8 de abril, enviou um e-mail à família dando-lhes um prazo de 30 dias para encontrar outra instituição e retirar a idosa do lar, sob ameaça de expulsão.
Segundo os vários documentos mostrados à Rede Regional pela família, a decisão de rescindir unilateralmente o contrato de prestação de serviços é justificada com o facto do LENE não admitir que se “coloque sob suspeita o nome desta instituição junto dos órgãos de polícia criminal”, uma vez que os factos apontados (e que foram apenas investigados internamente) “não têm qualquer suporte”.
Ao que a Rede Regional apurou, a instituição suspendeu o funcionário assim que surgiu a denuncia, e voltou a integrá-lo quando o processo de averiguações interno concluiu que não existem provas de quaisquer abusos de índole sexual ou outro tipo de ilícitos criminais.
“Negamos a existência de qualquer ato ou comportamento que coloque em causa a dignidade dos nossos colaboradores ou que seja suscetível de abalar a segurança e integridade física e moral dos nossos utentes”, afirmou o LENE em resposta à Rede Regional, acrescentando que “na sequência de reportada suspeita, foi despoletado o respetivo processo de averiguações interno. Da conclusão do mesmo, após várias e diferentes diligências, apurou-se a inexistência de factos da prática de qualquer ilícito criminal ou de outra natureza”.
O lar já fez a sua defesa perante a Segurança Social e já foi ouvido pela PJ, no âmbito da investigação em curso.
“Não queremos mais qualquer laço contratual com quem denigre, ofende e difama a nossa instituição”, transmitiu ainda à família queixosa a direção do LENE, que termina o e-mail ameaçando-os com um processo judicial por difamação.
“Desde o princípio que quisemos sempre acreditar que isto é tudo uma mentira ou um mal-entendido, mas nós esperámos sempre outra atitude por parte do lar onde ela estava desde 2013”, conclui a mesma familiar, acrescentando que a idosa “ainda se recorda bem destes episódios, mas está agora muito mais calma e tranquila” na instituição para onde foi transferida.
Contactado pela Rede Regional, o Instituto de Segurança Social confirma que em março foi rececionado no Centro Distrital de Santarém o relato de uma alegada situação de abuso a uma idosa integrada na Instituição identificada”, mas diz que “a Segurança Social não tem competências na área da investigação criminal”, pelo que “foi de imediato dado conhecimento aos Serviços do Ministério Público, assim como solicitados esclarecimentos junto da Instituição visada”.
Na mesma resposta ao nosso jornal, a Segurança Social esclarece que “tratando-se de uma entidade que desenvolve uma atividade tutelada pelo Instituto da Segurança Social, I.P., desde o relato da situação que têm vindo a ser desenvolvidos procedimentos junto da Instituição, designadamente através de pedido de apresentação de alegações e diligências desencadeadas pela mesma face à situação descrita”.