Carlos Mata, o ex-treinador de futebol do Ferreira do Zêzere, foi condenado a 20 anos de prisão efetiva, em cúmulo jurídico, pelos crime de homicídio qualificado e profanação do cadáver de João Perisco, com quem mantinha uma relação de grande amizade e proximidade familiar há 22 anos.
Mesmo com o corpo ainda por descobrir, o Tribunal Judicial de Tomar não teve dúvidas ao dar como provado que o arguido assassinou a sangue-frio e de forma planeada a vítima, quando esta lhe começou a exigir o pagamento de uma dívida, que se supõe rondar os 15 mil euros.
"Há um rasto de sangue que vai ter às suas mãos", afirmou o presidente do coletivo de juízes, Nuno Gonçalves, ao arguido, censurando-lhe o facto de nunca ter mostrado arrependimento, de ter mentido ao tribunal e de não revelar onde se encontra o corpo de João Perisco.
"A versão que a defesa contou em tribunal é grotesca" e assenta "no absurdo e na mentira", considerou o magistrado na leitura do acórdão, que decorreu na segunda-feira, 4 de Março, sob fortes medidas de segurança e com a sala de audiências do tribunal de Tomar a revelar-se pequena para todos os habitantes da aldeia da Soianda, onde ambos residiam, que quiseram assistir ao desfecho do caso.
Uma vez que não há cadáver, o juiz Nuno Gonçalves disse ainda que "trata-se de uma situação bastante invulgar em Portugal", mas recordou a jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre o chamado "caso Joana" para sustentar a decisão de condenar o arguido por todas as provas que o incriminam
O homicida foi ainda condenado a pagar uma indemnização cível de 110 mil euros aos pais de João Perisco.
Judiciária seguiu rasto de sangue até Carlos Mata
Para se decidir pela condenação, o tribunal valorou todas as provas obtidas durante a investigação pela Polícia Judiciária (PJ), que encontrou sangue da vítima num par de luvas que o arguido guardava no local de trabalho, nas roupas e no seu carro, vestígios que ficaram quando transportou o corpo para local ainda não apurado.
Carlos Mata foi ainda apanhado com os dois telemóveis de João Perisco, que, nos dias a seguir ao crime, utilizou para fazer telefonemas e despistar os familiares mais próximos acerca do desaparecimento da vítima, e que acabaram recuperados pela PJ.
Quando foi capturado, o ex-treinador de futebol confessou a autoria do crime e acrescentou que se tinha visto livre do corpo atirando-o ao mar, na praia da Nazaré, uma versão que se veio a revelar falsa.
Já em tribunal, o arguido sustentou que foi coagido e agredido por inspetores da PJ para confessar o crime e disse que João Perisco, na última vez que estiveram juntos, tinha sido levado por dois cidadãos brasileiros sob ameaça de arma, não o tendo visto desde então.
O tribunal acabou por considerar não provadas as alegadas agressões por parte da PJ de que o arguido disse ter sido vítima e considerou "absurda" a invenção da dupla de brasileiros e do alegado rapto de João Perisco.
Pena dura por ter matado com premeditação
Os factos em discussão remontam a 24 de Abril de 2012, quando os ainda amigos se encontraram na zona industrial de Tomar, onde trabalhavam, para discutir a dívida de Carlos Mata a João Perisco.
O encontro foi marcado pelo arguido, que, segundo o acórdão, já tinha planeado a morte da vítima.
Ambos entraram no carro de Carlos Mata, que o conduziu ao local isolado onde agrediu violentamente e asfixiou até à morte João Perisco, tendo de seguida ocultado o cadáver dentro de umas ervas.
Carlos Mata levou consigo os telemóveis e outros objetos pessoais do amigo e regressou no dia seguinte para consumar a ocultação do corpo, que terá transportado "para um local que só o arguido saberá onde é", salientou o juiz presidente do coletivo, lamentando que o mesmo tenha optado por "encenar manobras de diversão em tribunal, em vez de dizer a verdade e contar onde está escondido o cadáver".
Tribunal apreende arma de fogo ao advogado de defesa
A leitura do acórdão ficou marcada pela apreensão de uma arma de fogo, uma Magnum .32, a António Velez, o advogado de defesa de Carlos Mata.
Uma vez que a sessão decorreu sob fortes medidas de segurança e com todos os elementos do público a serem revistados à entrada da sala de audiência, António Velez declarou à PSP que transportava consigo a sua arma de defesa pessoal, devidamente legalizada e para a qual tem licença de uso e porte de arma.
Antes da leitura do acórdão, o juiz presidente solicitou a António Velez a entrega voluntária da arma, pedido a que o mesmo anuiu de imediato, bem como de todos os documentos exigidos por lei para prova da sua legalidade.
Uma vez que António Velez não se fazia acompanhar de todos os documentos, o juiz presidente apreendeu a arma e deu-lhe um prazo de 10 dias para os entregar junto do Tribunal de Tomar.