Pode não ser caso inédito mas serão certamente poucos os clubes, a nível nacional, em que a mesma pessoa interpreta três “personagens” no mesmo emblema, neste caso presidente, treinador e jogador.
No distrito de Santarém, a situação de Nuno Mateus será mesmo, atualmente, um caso único, uma vez, aos 32 anos, Nuno é a cara dos “Dragões” de Alferrarede, assumindo a presidência o cargo de treinador e de atleta da equipa sénior de futebol, que disputa a Série 1 da segunda divisão distrital da Associação de Futebol de Santarém.
Com fundação a 10 de maio de 1935, os “Dragões” são uma das coletividades mais antigas do concelho de Abrantes onde, à data da sua criação, existiam o Sporting e o Benfica de Abrantes. Foi justamente por esta necessidade de diferenciação que o clube começou a ser conhecido por “Dragões”, nome que mantém até hoje.
Em declarações à Rede Regional, Nuno Mateus refere que “nunca é fácil gerir um clube onde os apoios vindos de patrocinadores, quotização, e até mesmo da bilheteira escasseiam cada vez mais”. Por isso, os poucos dirigentes disponíveis têm de fazer um pouco de tudo e agradecer de uma forma bem vincada aos apoiantes.
No caso dos “Dragões”, o presidente do clube agradece à Câmara Municipal e União de Freguesias pelos apoios que de variadíssimas maneiras têm dado. “Temos o apoio da Câmara de Abrantes, que através do programa de apoio a colectividades do concelho – Finabrantes é, sem dúvida, o nosso maior apoio, mas, também a União de Freguesias de Abrantes (São João, São Vicente e Alferrarede) nos tem apoiado. Além disso, temos o apoio dos pais dos jovens jogadores, amigos e os meus directores, pois estes são incansáveis.
Sobre o orçamento, o presidente do clube refere que engana, pois as instalações são todas do clube e para manter tudo com uma cara bem limpa e erguida são precisos alguns gastos adicionais.
“A tesouraria é fácil de equilibrar, pois já estamos habituados a ter tão poucos recursos financeiros que muitas das vezes apenas só questiono o tesoureiro na reunião se está tudo pago. Quando ele diz que sim, para mim, é fantástico. Temos objectivos bem traçados a nível financeiro e não podemos facilitar. Vivemos um dia de cada vez e tudo fica mais fácil”, refere Nuno Mateus.
Com cerca de 800 associados, apenas 200 são pagantes, com uma quota que vai dos 7,5 euros aos 15 euros. Nuno Mateus justifica o diminuto número de sócios a pagar pelo facto de muitos deles terem, pelos mais variados motivos, deixado de acreditar no clube.
A rede Regional quis ouvir de Nuno Mateus como é ser presidente, treinador e jogador em simultâneo. “Aí é que a coisa muda um pouco de figura porque treino os juvenis e os seniores, jogo nos seniores e sou líder de um grupo. Há pessoas fantásticas na minha direcção que ajudam, e muito, a resolver alguns dos burburinhos que possam surgir”, afirma.
Para “complicar” ainda mais a tarefa, Nuno foi pai à pouco tempo. “Se a minha esposa não fosse tão compreensiva e tão minha amiga, as coisas talvez não fossem tão fáceis. Mas não quero dizer que tudo seja fácil. Sou um líder, tenho que saber separar as águas consoante as situações com que me vou deparando”, acrescenta.
Esta situação de acumulação dos cargos de presidente, treinador e jogador já se verifica pela segunda vez. A primeira foi de recurso mas desta vez foi uma decisão mais pensada. “Tudo na vida tem que ter um principio e um fim. Como jogador o fim está à vista e como treinador poderá estar a começar, ou não, agora. Tudo depende de resultados e da aceitação das pessoas, mas o principal motivo são as dificuldades financeiras, pois os treinadores pedem muito dinheiro e nós não podemos aceitar de maneira nenhuma” esclarece Nuno Mateus.
E quando o “treinador” pede mais um jogador ao “presidente”, como reagirá este? “Nenhuma dessas decisões é tomada por mim. Existe um director desportivo, falo com ele no treino e na próxima reunião expõe o caso à direcção. Todos juntos tomamos a decisão melhor para o clube e não posso ficar aborrecido como treinador porque queria o jogador e depois aborrecido, como presidente, porque tenho que pagar X na Associação de Futebol e não temos como fazê-lo”.
“São papéis diferentes, que muita gente nem tem a noção da dificuldade que é, mas um dia de cada vez e até 2017 estarei ao serviço dos Dragões”, esclarece o presidente-treinador do clube de Alferrarede , que adianta que em 2017 vai recandidatar-se novamente. “Existe muita coisa que quero fazer antes de terminar o meu percurso, nomeadamente chegar com os meus meninos ao futebol sénior, visto que comecei com eles nas escolinhas”, acrescenta.
Sobre o ambiente no balneário entre presidente, treinador e jogadores, o nosso interlocutor explica que as coisas acontecem naturalmente. “Se nada falta aos jogadores, eles reclamam de quê? Não lhes prometemos nada em questões financeiras, logo aí já é muito bom. Felizmente nunca entrei dentro do balneário e foi preciso puxar dos “galões” de presidente e colocar alguém na ordem. A minha função é conseguir trazer gente boa para os Dargões e não correr com este ou com aquele. Por vezes um simples gesto de amizade resolve tudo. Também joguei futebol e sei como é que eu era, por isso, talvez, para mim seja mais fácil”, frisa o treinador.
Acerca dos cargos que desempenha, em simultâneo, Nuno Mateus acrescenta que os cargos não se confundem. “Existe um respeito enorme entre mim e os jogadores e dentro do balneário sou treinador/colega, seja no treino ou no jogo. Terminado o jogo ,sou o responsável máximo pelo clube e isso ajuda muito a que, por vezes, não existam confusões. Tenho um balneário acima da média em que confio plenamente e isso facilita a vida de um treinador, reforça.
No clube de Alferrarede, neste momento, a única modalidade praticada é o futebol de formação e senior. “Temos cerca de 75 atletas, pois estamos a iniciar as escolinhas e estamos, ainda, numa fase muito prematura para se saber quantos ficam”, acrescenta Nuno Mateus concluindo que o objectivo desportivo para esta época é igual ao de todas as outras: “fazer o melhor possível”.
Grácio dos Santos
